IDOSO NÃO É PALAVRÃO
Ser idoso é carregar da juventude muitos erros e acertos sem se queixar do peso, é valsar com a idade sem pisar na dama.
A velhice é uma bruxa que voa por aí, a procura de um idoso que parou de sonhar e nele pousa para transformá-lo em velho. Daqueles que puxam uma carroça de mau humor.
A longevidade de uma vida é um prêmio concedido àqueles que, com arte, conseguiram viver os bons e os maus momentos. A cartola pode estar cheia de lenços negros e a mágica consiste em colorir antes de retirá-los. As lembranças ruins precisam ser refinadas na memória e isso leva um bom tempo. Muitos jovens perdem cedo a vida sem aprender dela a grande mágica.
Ser idoso é aceitar, sem rusgas, as rugas que o tempo acumula. Ensinar aos jovens que andar sobre o fio do tempo, sem rede de proteção, não é sabedoria. O idoso sabe que o ponto de equilíbrio, entre os bons e maus momentos, é o bom humor. Por isso, ao olhar-se no espelho e ver sua embalagem amassada, ele sorri com a certeza de que o produto não foi danificado.
Jamais tente aprender com um velho qualquer coisa. Ele é o senhor do mau humor e da ingratidão.
Poucos assumem serem velhos. Recusam-se a aceitar a semelhança com o outro, quer seja nas atitudes ou na aparência.
Não se assustem com a meia idade, pois a cada ano ela avança um pouco mais.
Se as mesmas histórias narradas por um idoso te irritarem, atente, pois está se tornando um velho. Com o tempo, evitará reuniões familiares e sociais, pois a proximidade provoca comparações. Velho não suporta espelho. Quer esquecer a própria idade.
Depois, com a alma enrugada, vai desfazendo os laços com os quais a vida o presenteou: sua família e seus amigos. Isola-se. Cuidado, velho! Espelho é o conta-gotas do tempo, e você, o frasco que só se completa com a morte. Idoso, não é palavrão, é medalha que devemos carregar de peito aberto.
Deixe vir as rugas da face, mas não permita que elas invadam a alma, por que dessas as plásticas não cuidam.
Eu queria fazer uma crônica sobre o jovem: belo, viçoso, com uma longa estrada a percorrer, juntando tudo de bom que a vida tem. O tempo é seu amigo, mas se dele não cuida, ele foge. A juventude passa por nós com a velocidade de um furacão e a velhice caminha ao nosso lado com passos de tartaruga. Quanto a mim quero somar anos a minha idade. Quero ser idosa.
Meu caminhar nunca é solitário, ando com as lembranças do passado e convivo em paz com meu dia a dia.
Busco nas ruas figuras do cotidiano, para compor meus textos e sempre encontro os personagens que procuro.
Chamou-me a atenção, um senhor com um “topetinho de Neymar”. Com uma bola nos pés, solto na sua idade avançada, caminhando ao lado de um jovem. O jovem apressado controlava os passos. O senhor não tinha pressa, voltava a bola como gostaria de voltar o tempo. Na vida quantos passos importantes não foram dados... quantos beijos técnicos foram trocados. E o amor verdadeiro como foi tratado?
Certamente, aquele senhor idoso, teria tanto para dizer ao jovem. Mas este, apressado, tinha um acordo com o relógio e hora marcada com a pressa. De repente, algumas palavras apressadas romperam o silêncio.
— Vô, apresse o passo!
— Apresse tu! Por que eu estou voltando.
Sim, há uma hora na vida que o idoso volta para apagar os incêndios que propagou ou para colher o que semeou.
Os velhos não voltam. Estacionam à margem da vida, sem um sorriso que os acaricie.
Emilia Goulart é escritora, membro da UBE (União Brasileira dos Escritores), da Cia dos blogueiros
e do Grupo Experimental AAL (Academia Araçatubense de Letras)
Comentários
Ainda estou aprendendo. Espero não sair da escola.
Rita Lavoyer
Beijo grande no seu coração corajoso e sincero.
Emília