Devagar se vai longe
Devagar se vai longe
D. Canô foi longe, eu também quero ir. Sigo Nilo Amaro pela
cantiga afora: “ leva eu minha sodade... quando chego na ladeira tenho medo de
cair”.
Nesta hora a gente quer ficar, a não ser que uma dor maior que
a saudade nos faça desistir da vida. Se eu continuar viva até onde chegou a
Dona Canô eu levarei muita saudade. Porque saudade é como erva daninha, brota
todo dia no coração da gente.
A vida é muito bela, desprezá-la como coisa comum que pode
acabar a qualquer momento não é sabedoria. Canô tinha respeito pela vida e soube
cuidar da sua muito bem.
Minha vida eu trago
como pipa na linha, deixo-a flutuar entre nuvens, recolho-a se o tempo muda e percebo
chuva, não a expondo sob-raios e trovoadas. Não sei se temos o controle da vida
nas mãos, por isso não embarco na velocidade do tempo. Quero ir é devagar,
devagarinho...
Sei que o tempo é
voraz, consome dias, meses e anos com
tanta rapidez que não nos damos conta e quando notamos estamos idosos.
A vida é uma locomotiva que passa por nós engatando vagões de
saudade. Qualquer dia ela pode nos recolher.
Os amigos, alguns flutuantes e outros ficantes. Não este ficar
ocasional dos tempos modernos, mas, aqueles que foram, são e serão nossos
amigos, esses que ficam com os quais podemos cantar , “amigos para sempre...
Tenho amigos que estão comigo há várias primaveras, acompanharam
e fizeram sombra no meu verão e hoje, no outono da vida quando preciso de uma
bengala ou um muro para as lamentações, lá estão eles esquecidos das suas dores para
espalharem bálsamo sobre as minhas.
Por tudo que a vida nos oferece ela deve ser vivida com
dignidade até o fim. A família, bem perto acompanha o nosso ir, enquanto a
saudade vai compondo nosso comboio. As crianças, que dormiram numa mesma cama
com os pais, cresceram e se foram para outras camas. Outras contra a própria
vontade se ausentaram dos pais, como no caso de Caetano Veloso que a perversa
ditadura o manteve fora do país longe de Dona Canô, por um bom tempo,
Tempo em que a Claudionor Viana Teles Velloso, nascida em
Santo Amaro Da Purificação, a 16 de Setembro de 1907, católica , procurou Mãe Menininha do Gantois, pedindo proteção para o filho exilado.
Dona Canô, mulher
independente se projetaria em qualquer situação que a vida se lhe apresentasse,
mas, quis Oxalá , o Orixá da paz, que ela fosse a mãe de Caetano
Veloso, Maria Bethânia e outros seis filhos.,certamente pediu proteção e que ele voltasse, e ele voltou. Dona Canô pagou a conta com muito
respeito, mas nunca deixou de ser católica.
A vida é bela porque
mesmo momentos assim se transformam em suave saudade. Todos nós temos nossos
bons momentos, e com um pouco de sabedoria não deixamos os maus criarem raízes.
Chega um tempo em que a locomotiva não sai mais do abrigo, o
carvão acabou . D.Canõ puxou seus vagões
até o último carvão. As saudades que ela
armazenou, ocupará o espaço deixado por essa sábia mulher.
Mas sem dúvida a partida deve ser o mais difícil momento das
nossas vidas. É este o grande exemplo que a matriarca dos Veloso nos deixa.
Seja a guardiã da tua família, assim terá o respeito de teus filhos até o fim.
Dona Canô a mulher que interferia na vida política, religiosa
e cultural de Santo Amaro da Purificação, morreu no dia 25 de Dezembro de 2012,
data escolhida para comemorar o aniversário do Menino Jesus.
Não sei como é o depois, mas talvez Dona
Canô tenha ido cumprimentar o Menino!
Emília Goulart
Comentários
Satisfeita por saber que está retornando à sua página virtual. Isso é muito bom, Emília!
Agora presenteia-nos sempre com os seus textos, poemas, todos cheios de sabedoria e ensinamentos. Adoro os seus textos, e quero que saiba que você tem muitos leitores, admiradores, viu!