Inspiração

 


A inspiração para as artes, surgi como o sol de uma linda manhã. Esta manha atemporal que pode estar no passado, presente ou futuro não importa, ela é sua. Apenas você é capaz de sentir. Coloque nela o outono,  a primavera ou um verão incandescente, daqueles que afloram em tardes frias quando se faz amor. Amor mesmo, amor de verdade e com vontade. Inspiração também chega em versos escritos ou cantados por alguém. Uma frase mágica que se liberta do todo. Ou um tolo verso declamado por um adolescente apaixonado, um adulto traído ou um velho saudoso. Inspiração é o sol que ilumina uma manhã tristonha de um dia cinza.

Como é prazeroso este sentir-se inspirado!

Tenho o hábito de destacar páginas de revistas que me chamam a atenção para ser lida após os afazeres domésticos, que por vezes tornam-se guardiões das inspirações de uma escritora que ainda esta presa a rotina diária da dona de casa. Guardiões domésticos não são afeitos a cultura e as artes, consomem como gafanhotos nossas inspirações.

Tem razão o amigo que distingui as escritoras da Academia de Letras Araçatubense com seu chavão humorado, porém, maldoso: “Aqui não temos escritoras, temos donas de casa que escrevem”.

Este machismo exacerbado de homens que não aprenderam a cuidar das próprias cuecas, não cabe ao amigo, destoa da pessoa culta que é. As  biografias de Cora Coralina, Clarice Lispector e outras tantas, que conciliaram a família, o trabalho, o lar e a literatura. Biografias bem mais interessantes e dignas que a de certos autores que se tornaram famosos após serem contemplados  pelo machismo representativo nos poderes. Instalaram-se em uma repartição publica para receber dos governos pelos serviços não prestados e ter tempo livre para escrever. Estava instituído o funcionário fantasma.

Nós as escritoras do Século XX, XXI que após exaustivas tarefas, nos dedicamos ao prazer da escrita, ainda lutamos por um espaço nas jaulas, onde  os  leões são servidos à vontade.  O dom e a inspiração da escritora dona de casa esta impregnado de tempero.

 Hoje encontrei a inspiração guardada em meio a tantas velhas receitas médicas que nenhum efeito fizeram para as dores da desvalorização que se tornaram crônicas.   

Em uma página destacada por mim de uma velha revista, esquecida no consultório de algum médico. Sim, sou eu a ladra de textos interessantes, como esta entrevista com a escritora e poeta paranaense Alice Ruiz, uma mulher atenta  aos avisos da vida.  Foi casada com Paulo Leminski, por vinte anos, continuou em Curitiba até tomar uma decisão, vir para São Paulo. “Ficar, seria envelhecer eu acabaria virando uma vovozinha.”  Relações afetivas e de trabalho estão agora afinadas. Ela se mantém unida a família que continua em Curitiba.

Tudo tem sua hora, se atropelarmos a trajetória não seremos nunca nem escritoras nem mães. Continuo a ser eu, escritora, mãe, mulher e dona de casa.  Parar deve ser um ato involuntário e desistir é indigno do ser humano.

 

Clarice e Cora nos parecem tão distantes e tão domesticadas. Foi preciso uma Alice Ruiz. Ela colocou o dedo na ferida ao aproveitar a inspiração para escrever este poema.

“Era uma Vez

Era uma vez uma mulher

que via um futuro grandioso,  para cada homem que a tocava.

Um dia

Ela se tocou”.

Não tenho ambições materiais, tenho ambição criativa.

Vou me dedicar mais ao meu fazer literário neste 2016  e conto com minhas amigas escritoras donas de casa que escrevem,  para buscar mais manhãs de sol neste sombrio porão de preconceitos que ousa criar categorias para escritoras. No lar cunha-se a matriz, fonte da inspiração.

Termino minha crônica com um verso de “As Consequências”, de Anon.

 “Adão enquanto você dormia, Eva foi criada”.

  

                                                                                       Emilia Goulart

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